A equipe do Keroseed traz para você querido leitor mais um post na pegada de “vale a pena ver”, então desde já te desejo uma boa leitura.
Na temporada de primavera de 2018, um anime de comédia acabou chamando a atenção de um público supostamente não muito casual que foi capaz de apreciar o título devido ao caráter cômico da sua narrativa, seus personagens marcantes e bastante cativantes, e pelo modo como a obra critica a própria sociedade japonesa em suas várias instâncias. Desde o esquema corporativista, que nega ao trabalhador sua própria humanidade em favor da eficiência de suas empresas, até o desbalanço social, econômico e educacional que há entre as camadas ricas e podres em nossas cidades, ainda que elas dividam os mesmos espaços.
Para quem acompanha animes já sabem que estou falando de Hinamatsuri.
Entretanto, outro anime que estreou na mesma temporada não teve tanta sorte (ainda que eu ache que mais pessoas deveriam ter visto Hinamatsuri): Em sua sexta reencarnação para a televisão japonesa, GeGeGe no Kitaro apresenta em muito das qualidades de Hinamatsuri no que se trata a crítica à sociedade japonesa, porém, diferente desse, em GeGeGe no Kitaro a crítica não é dada como parte da premissa narrativa da obra, e sim como uma característica segundaria de sua estrutura episódica.
Tendo ficado claro ou não vou explicar um pouco melhor: A animação de 2018 comemora os 50 anos da franquia, e se trata da clássica história de monstros semanais, em que nosso protagonista(Kitaro) a cada novo episódio enfrenta um inimigo diferente(Yokais), junto de personagens de apoio(Mana, Neko Musume, e outros Yokais aliados), para proteger a humanidade.
Contudo, apesar de Kitaro enfrentar, e selar, muitos desses Yokais, o que geralmente inicia o conflito com esses seres do folclore japonês não é a natureza maligna dessas criaturas, e si as próprias atitudes e particularidades de nossa sociedade.
Por exemplo, o conflito do episódio 9, em que kappas abandonam seus rios para ocuparem cadeiras em frente de computadores, só se inicia pois um empresário, tomando pela sua ganância e desejo pelo lucro de sua empresa, busca os serviços do traiçoeiro Nezumi Otoko para contratar funcionários que trabalhassem por menos e por muito mais tempo.
Ao mesmo tempo, o mesmo rato-homem ao ver-se endividado com a máfia no episódio 5, decide explorar o deus do trovão Raijin para fundar uma empresa de energia elétrica que, temporariamente abastece parte da estrutura elétrica do Japão com energia barata devido a vantagem óbvia contra as outras companhias.
Ou ainda, no episódio 13 quando esse mesmo personagem utiliza de uma estratégia similar para imundar o mercado com diamantes baratos ao literalmente fornecer sacrifícios humanos ao yokai Wanyuudoo em troca dessas pedras preciosas. O que obviamente chama atenção de comerciantes de diamantes, que de forma engenhosa exploram guerras e conflitos entre nações Africanas para adquirir de maneira barata a joia, enquanto a disponibilizam ao mercado como escasso artigo de luxo.
E obviamente, a ganância e a ideia de que o dinheiro vale mais do que a vida humana não são os únicos temas explorados em caráter secundário pela trama. No episódio 19, apesar de bastante sutil, há uma crítica ao sistema rígido e burocrático do ensino japonês ao mostrar uma sala de aula em que o aluno estuda de uma forma mais solta e divertida, tornando o ensino mais atraente para estudantes que normalmente têm baixo desempenho escolar no ensino atual.
Ou ainda, no episódio 15, em que a série não apenas nos mostra o quão cruel é uma sociedade que rejeita as pessoas baseada em suas aparências como nos coloca na pele de alguém disposto a arriscar tudo em troca de um corpo perfeito (ou um rosto, no caso do episódio) ao rejeitar a falsa moral de que “mais vale ser você mesmo do que ser aquilo que você gostaria de ser”.
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